sexta-feira, janeiro 29, 2010

Decidiu não decidir

Estava pra nascer uma pessoa indecisa como ele. Ele, que, por sinal, já tinha nascido indeciso: recebeu de seus pais um nome duplo e não conseguiu decidir se é melhor se apresentar com o primeiro ou o segundo nome. Mais de 25 anos se passaram e a dúvida permanece.

Na escola, o primeiro nome era o preferido dos amigos (não tinha muitas amigas nessa época). Em casa, era conhecido apenas pelo segundo nome, quase sempre usado no diminutivo, coisa que persiste até hoje, afinal, as mães teimam a entender que sim, os filhos crescem.

Ele demorou a pereceber que essa sutileza de seu caráter, essa indecisão intrínseca ao seu modo de vida, vinha de cedo. Nada poderia exemplificar de maneira mais precisa essa sua natureza indecisa do que o fato de, após apelidos, diminutivos e alcunhas, permanecer a dúvida a respeito de qual nome utilizar.

Todo mundo sabe quem é. Todo mundo, entre milhões de apelidos que podem surgir em casa, na escola, no trabalho, no futebol, na cama, sabe como prefere ser chamado. Todo mundo menos ele.

Não que ele pense nisso 24h por dia. A dúvida só surge de fato quando ele precisa se apresentar a alguém. A cena é clássica: naqueles breves instantes entre a esticada da mão (ou a esticada do pescoço, para dar um beijinho de bochecha) e a abertura da boca para proferir seu nome, a dúvida, tal qual um morador com dor de barriga faz com a porta de sua casa quando percebe que esqueceu a chave, bate incessantemente. Quem ele vai ser dessa vez?

A indecisão (e talvez a loucura, diga-se de passagem) fez com que ele criasse teorias acerca de sua personalidade. Definiu que o primeiro nome era mais instropectivo, mais sério, mais calça de moletom e tabuada do 7. Já o segundo era mais de esquerda, mais dos bares, mais da vida. Julgou que ter dois nomes significava que ele poderia ter também duas personalidades. A verdade é que mesmo se tivesse apenas um nome, continuaria tendo múltiplas personalidades. A desculpa dos nomes, pelo menos na cabeça dele, é que servia perfeitamente para a ausência de decisão que permeava a sua, ou melhor, as suas existências, já que não era um, senão dois.

Em momentos de indecisão, essa teoria dos nomes e das personalidades ganhava força na mente dele. Quando importantes decisões demandavam sua atenção, ele ficava mesmo era pensando nessa coisa dos nomes, nessa coisa da indecisão que nasceu com ele, muito antes de que ele pudesse ter percebido que era assim, e nada poderia fazer para mudar. Quer dizer, até poderia fazer alguma coisa para mudar isso. Ele é que não sabia, dentre as muitas opções, qual escolher.

2 Comments:

At 19:06, Blogger GuTanaka said...

E o que dizer do Luis Fabiano, que alem de Luis ou Fabiano é chamado de Fabio Luciano?

 
At 11:33, Anonymous Ana Cláudia said...

Vim deixar um comentário e me deparo com essa sua frase de desdém ao que penso... não sei agora se "uso" a Ana, brincalhona, meiga e delicada, ou se deixa a Cláudia, séria, nerd, advogada, te responder... rsrs...
Adorei o texto! Parabéns... Luiz... ou Felipe?!

 

Enviar um comentário

<< Home