segunda-feira, outubro 01, 2007

Vendange II

Depois do “cascrout” (se você não sabe do que estou falando, ou pegue um dicionário francês-português ou, mais fácil ainda: leia o post anterior a este) voltávamos ao trabalho. Vale ressaltar que o galão de vinho era sempre esvaziado nesses 10 minutos de folga. Aliás, vinho lá era tomado como água, em todas as refeições, com exceção do café da manhã. Era por isso que, depois do lanche, o ritmo caía vertiginosamente e a vontade de mijar caminhava no sentido oposto.

Às 12h em ponto, batíamos em retirada. Obviamente, hora do almoço. Na van, no caminho de volta, uns aproveitavam para curar cortes, outros para trocar de camiseta (raríssimos, e eu não me incluía nessa lista), outros para fazer piadas que eu não entendia. Lembrei da minha primeira vez no cinema, quando fui assistir às Tartarugas Ninjas: como não entendia inglês e, recém alfabetizado, não conseguia acompanhar as legendas, ria quando todo mundo ria, mesmo sem entender o que estava acontecendo. Na colheita de uvas, acontecia a mesma coisa. Não entendia as piadas feitas em francês, mas meu sorrisão nunca deixava transparecer isso.

O almoço era uma experiência sócio-gastronômica. Entrada, primeiro prato, segundo prato, sobremesa, queijo. O curioso era que ninguém trocava de prato, e foi aí que entendi o porquê de tantos pães na mesa. Era o jeito mais prático de limpar o prato e não misturar o feijão branco do primeiro prato com a mousse servida na sobremesa. O fato é que comíamos muito, sempre com o vinho para acompanhar. Resultado: batia aquela lombra, e a vontade de trabalhar, que já não era grande, diminuía ainda mais. Eu não negava uma deitadinha na grama, mas raramente sobrava tempo para um cochilo ou algo que o valha. Tinha que voltar pra van, pois o período da tarde reservava mais trabalho.

A rotina da tarde, semelhante a da manhã, durava até as 17h00, se não me engano. Como não tinha relógio, confiava nos outros, só que mais uma vez, meu parco francês me impedia de definir com precisão o horário que tinha ouvido na resposta. A única coisa que mudava era o nível alcoólico das pessoas. Mais um ou dois galões de vinho iam embora, e, com isso, muito mais piadas surgiam. Eu continuava a não entender nada, mas percebia pelas risadas cada vez mais altas.

Voltando ao acampamento, um belo banho em um vestiário (bondade minha chamar de vestiário aquilo ali) sem luz. Tudo escuro. Por mais que eu passasse sabonete no corpo, sempre saía sujo dali, pois não conseguia enxergar onde ainda estava sujo.

Depois disso, um jantar com mil opções de pratos e, sempre ele, o vinho para acompanhar. Mais algumas piadas e mais alguns sorrisos forçados de minha parte, algumas cenas patéticas como camponeses caindo no chão de tanto álcool ou sendo carregados em carrinhos de mão e voltávamos para os nossos quartos, que tinham aquele cheiro acre de cidade do interior na quarta-feira de cinzas. O cara da Guiné que parecia lateral do Santos na época do Pelé ligava seu radinho e tentávamos dormir.

Pra variar, durante a noite, umas duas ou três pessoas me acordavam, pedindo para eu parar de roncar. Sonado, eu ouvia algo como: “Non ronquê, sil vu plê” e voltava a dormir como se nada tivesse acontecido.

3 Comments:

At 19:09, Blogger Unknown said...

E as prinças? Não foi pro abate???

 
At 16:18, Anonymous Anónimo said...

livro de auto-ajuda é como igreja, não?! sempre tem um deus salvador que vai e levar pro paraíso, só que nos livros eles admitem que deus não é tão gatinho quando a figura de jesus que conhecemos. ou to errada?

 
At 11:02, Anonymous Anónimo said...

"O cara da Guiné que parecia lateral do Santos na época do Pelé" - hahahahahaha

 

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