sexta-feira, setembro 28, 2007

Vendange I

Setembro de 2006.

Estou eu em Lyon, na França, quando dois amigos, um tanto quanto loucos, me convidam para ir colher uvas. Ali numa cidade próxima, 45 minutos de viagem, no máximo. Um amigo da Guiné tinha ligado para um dos meus amigos, avisando que estavam precisando de gente e que pagavam bem, 70 euros por dia. Nem fiz as contas: fui.

Chegando lá, uma senhora gorda, aparentando uns 45 anos (depois descobrimos que ela sequer tinha 35) nos pegou na estação de trem. Dentro de sua mini-van, pudemos descobrir o quão braço são as mulheres francesas. Uh, lá lá, quase morremos na estrada.

Mas conseguimos chegar à fazenda. Eram mais de 20 trabalhadores: 5 de Camarões, um inglês que depois ia colher azeitonas na Itália, um designer gráfico português desempregado, um açougueiro do Sri Lanka que morava na Bélgica e ouvia Iron Maiden no seu ipod, duas estudantes belgas de letras, uma estudante de engenharia alemã e outras figuras, como um cara de Guiné que tinha cara de lateral esquerdo do Santos da época do Pelé. Dali, poucos falavam outra língua além do francês, e eu, ao contrário, arriscava (e geralmente errava) apenas algumas frases prontas na língua do Robespierre.

Então, canceriano e introspectivo que sou, resolvi aproveitar a falta de habilidade para me comunicar, para apenas observar as situações. Ali, em um mundo que nem de longe era o meu, pude perceber quantas diferenças existem entre o Brasil e a França.

A rotina, sem dúvida, era dura. Depois de um café bem pobrinho, com bolachas e olhe lá, subíamos nas duas vans da família e íamos para o campo. Mal passava das 7h30. A partir do momento em que descíamos, começava a gritaria. Pegávamos nossos baldes e tesouras e logo em seguida o capataz, um senhor de uns 45, organizava a tropa em duplas, para que cada uma tomasse conta de uma fileira de parreiras. Geralmente ele escolhia uma dupla pra servir de “coelho”, aquele cara que corre as maratonas num ritmo acelerado, para aumentar a velocidade dos outros. Geralmente, os camaroneses-armário eram escolhidos para a função, pelo simples fato de que minha coxa era metade do braço deles. Eu, ou ficava com um de meus também iniciantes amigos brasileiros, ou com alguma mulher belga. O que era bom, pois elas eram bem gostosas, e falavam inglês e espanhol. Ou seja, consegui xavecar mesmo durante uma colheita de uvas. Vencedor.

Às 9h30, a primeira pausa. Um galão de vinho, um galão de água, salame, pão, queijo e chocolate. Era o “cascrout”, também conhecido como hora do lanche. Nessa altura, minhas costas já estavam doendo muito, de tanto ficar abaixado para cortar os cachinhos de uva. Aproveitava então para comer, e muito. E para beber vinho, apesar do horário. Dez minutos mais tarde, um pouco mais bêbado e gordo, pegava meu balde e minha tesoura novamente.

terça-feira, setembro 11, 2007

Ê, Miltão

Peso e elogio. Duas coisas que o Miltinho, ou Miltão, ganhava com extrema facilidade. Mais o primeiro do que o segundo, é verdade, até por motivos óbvios. Mas, por incrível que pareça, quanto mais ele engordava, mais ele fazia sucesso. Sim, com as mulheres também.

Quem reparou isso foi o Juca, num desses churrascos com o pessoal do futebol. Eles estavam conversando sobre mulheres, obviamente, quando o Juca soltou a pérola: “Quando a mulher começa a pegar muito no seu pé e pouco no seu pau, tá na hora de trocar de mulher”. Todo mundo achou graça. Menos o Miltão. “Mulher pra mim é que nem flor. Gosto de regar pelo menos uma vez por dia”.

Entre risadas, o Juca comentou que o Miltão falava com propriedade, porque ultimamente aparecia com uma mulher diferente a cada semana. E com um quilo a mais a cada semana, finalizou ironicamente. O pessoal achou graça. Só o Miltão que não. “Quem gosta de osso é cachorro.”

O pessoal não tava se agüentando mais. O Miltão não podia estar falando sério. Antes, quando falso magro, ele era quase um mestre-sala, que ficava ali, sempre ao lado da mulherada, mas só vendo os outros secarem. No máximo, um arame liso, que cerca mas não machuca.

Hoje, a situação era diferente. Com quase cem quilos, chovia mulher na horta dele. Ninguém sabia porque, afinal, ele não era nenhum Gianechini. Tava mais pra Sergião Loroza. E mesmo assim, a fila tava grande. Foi aí que ele resolveu explicar.

“Eu faço sucesso porque já me decidi: sou um heterossexual passivo”. Neguinho resmungou lá de longe. “Que porra é essa, Miltão?”. E com o sorriso mais maroto que podia fazer naquele momento, Miltão finalizou:
“Eu fico deitadão, paradão, e elas ficam só por cima, fazendo tudo”.

Ê, Miltão.